Ah, olha só quem apareceu nessa noite escura e suja da cidade de Vitória. O velho radialista do bairro Jucutuquara, aquele que destila suas palavras roucas e carregadas de fumaça pelo ar da madrugada. Um bebedor inveterado, percorrendo os bares da rua da lama com sua gravata torta e sua camisa desbotada, como se o tempo tivesse esquecido de passar por ele.
Ele é um daqueles tipos que o pessoal costuma chamar de “boêmio”, embora não haja muito glamour nesse termo. Não, ele não é o tipo de cara que recita sonetos à luz de velas. Ele é mais do tipo que enche a cara até não conseguir distinguir a diferença entre um verso e um xingamento.
Mas há uma peculiaridade nesse velho desgastado pelo tempo e pelo álcool. Ele tem um gosto por mulheres mais velhas, aquelas que já atravessaram os anos com uma bagagem de histórias para contar. Não é por qualquer fetiche, é pela compreensão mútua que compartilham, pelos olhares cansados que parecem entender o que palavras não conseguem explicar.
No entanto, apesar de sua aparência atraente, há algo que espanta essas mulheres. Seu ego, grande como a lua que muitas vezes ele contempla em seus momentos de devaneio alcoolizado. Ele se vangloria de suas palavras, de sua voz rouca que já encantou muitos ouvintes notívagos. Mas é justamente esse ego inflado que acaba afastando aquelas que ele deseja.
Ele não percebe, ou talvez finja não perceber, como suas palavras arrogantes e suas piadas autodepreciativas o afastam das mulheres que ele tanto deseja. Ele as deixa desconfortáveis, fazendo-as sentir que são apenas mais uma audiência para seu show egocêntrico. E assim, ele continua sua jornada solitária pelos bares da rua da lama, afogando suas mágoas em doses de whisky barato.
No fundo, ele sabe. Sabe que a sua própria voz, aquela que seduz tantos ouvintes na madrugada, é também o seu pior inimigo quando se trata de conexões reais. Ele sente a tristeza se acumular em seu peito enquanto olha para o vazio de mais um copo vazio. A ironia da vida é cruel, como um poema amaldiçoado que ele não consegue parar de declamar.
E assim, o velho radialista do bairro Jucutuquara continua sua jornada noturna, em busca de um calor humano que parece escapar entre os dedos como areia. O ego dele é sua armadura e sua prisão, mantendo-o em um ciclo infinito de solidão. No final das contas, ele é apenas um homem perdido nas sombras da cidade, tentando encontrar um eco da humanidade que sua voz costumava alcançar.