(Arte: Lízzie Almeida)
Promovido pela Unimed Sul Capixaba em parceria com o Núcleo Feminino Cooperativista, o projeto une saúde preventiva e educação para oferecer consultas oftalmológicas e óculos gratuitos a estudantes da rede pública
Por Lízzie Almeida
No interior do Espírito Santo, um simples par de óculos vem abrindo portas que muitas crianças nem imaginavam existir. Estudantes de escolas públicas, que antes lutavam para enxergar a lousa, acompanhar os colegas ou até brincar em casa, agora descobrem um mundo nítido, cheio de novas possibilidades. Esse é o resultado do Projeto ViVer, iniciativa da Unimed Sul Capixaba em parceria com o Núcleo Feminino Cooperativista, escolas municipais e voluntários da área da saúde.
Já na Emeb Pluridocente Tijuca, em Cachoeiro de Itapemirim, município localizado ao Sul do Espírito Santo, o impacto do projeto foi sentido de forma imediata. A professora e gestora da escola, Valéria Benevenuto, lembra que uma de suas alunas, Keylla, de apenas 11 anos, vendia bombons na porta da escola para conseguir comprar os óculos de que precisava.
“Pouco depois, o projeto chegou, trazendo não apenas a solução para ela, mas também esperança para muitas famílias. Foi emocionante para toda a escola”.
– Valéria Benevenuto
O caso da estudante simboliza a realidade de muitas crianças que enfrentam dificuldades semelhantes e mostra como a iniciativa pode transformar histórias de vida que, de outra forma, permaneceriam invisíveis.
O Brasil enfrenta um desafio silencioso. Divulgado no final de 2024, um levantamento feito pelo projeto social ‘Em Um Piscar de Olhos’ com 110.700 crianças e adolescentes de 6 meses a 15 anos, em nove estados brasileiros, revelou que 19% deles apresentavam algum problema oftalmológico. Muitos não utilizavam a correção adequada, o que desencadeava dificuldades de aprendizado e até mesmo casos de evasão escolar.

Percentual de crianças com problemas visuais no Brasil. (Fonte: projeto social Em Um Piscar de Olhos | Imagem: Lízzie Almeida).
O Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), também vem alertando para o aumento desses problemas na fase escolar. Segundo a entidade, cresce a prevalência dos chamados erros refrativos, como miopia, hipermetropia e astigmatismo, que comprometem a nitidez da visão e, consequentemente, o desenvolvimento escolar. A estimativa é de que 23 milhões de brasileiros em idade escolar apresentem algum desses problemas, o que reforça a urgência de iniciativas preventivas como o Projeto ViVer.
O relato de Valéria sintetiza o que muitos educadores da rede observaram: ao atender casos urgentes, como o de sua aluna Keylla, o projeto mostrou seu potencial de transformar a rotina escolar e fortalecer os vínculos com a comunidade.
Segundo a docente, os efeitos logo ficaram visíveis. Estudantes que antes tinham dificuldades de acompanhar as aulas passaram a se envolver mais, enquanto as famílias, muitas vezes sem perceber os problemas de visão dos filhos, compreenderam a dimensão do impacto no aprendizado.
“Essa ação serviu como aprendizado para todos nós. O impacto positivo foi sentido dentro e fora da escola, elevando a autoestima das crianças e aproximando ainda mais a comunidade da instituição de ensino”.
– Valéria Benevenuto

Da triagem à entrega dos óculos: Victor Rafael, criança atendida pelo Projeto ViVer realiza exame oftalmológico, escolhe a armação e recebe os óculos gratuitamente, garantindo acesso à visão de qualidade (Fotos: Unimed Sul Capixaba).
Quando a educação, a saúde e o voluntariado se encontram
Dentro da própria sala de aula tem início o atendimento. Professores são capacitados para identificar sinais de dificuldade visual em seus alunos com o uso de optótipos simples, uma metodologia recomendada pelo Governo Federal. “A triagem é acessível e permite que qualquer professor a replique, garantindo que os casos sejam identificados cedo e tratados rapidamente”, explica o oftalmologista Fernando Lemgruber, diretor-presidente da Unimed Sul Capixaba.

Oftalmologista e diretor-presidente da Unimed Sul Capixaba, Fernando Lemgruber Prado Costa (Foto: Unimed Sul Capixaba).
A partir dessa capacitação, estabelece-se um fluxo estruturado e eficiente: os professores realizam a triagem de todos os alunos, identificando aqueles com maiores dificuldades visuais. “A capacitação permite que eles usem um instrumento simples e acessível, capaz de apontar quais crianças precisam de avaliação oftalmológica. É um processo reprodutível que garante continuidade nos anos seguintes”, continua Lemgruber.

Oftalmologista da Unimed Sul Capixaba, Eduardo Abib, durante atendimento a uma criança beneficiada pelo projeto (Foto: Unimed Sul Capixaba).
Quando os casos mais graves são detectados, as crianças são encaminhadas para consulta com oftalmologistas voluntários do Centro Médico Especializado (CEMES), que oferecem atendimento completo e personalizado.
“Quando uma criança que antes não tinha acesso à saúde ocular consegue enxergar corretamente, todo o esforço se torna gratificante: ela desenvolve plenamente habilidades de leitura, escrita e aprendizado”.
– Fernando Lemgruber
A metodologia, reconhecida pelo Governo Federal, é simples, segura e permite que os professores se tornem multiplicadores, ampliando o alcance do projeto para outras turmas e escolas.
Após a consulta, caso seja necessária a prescrição de óculos, eles são fornecidos gratuitamente, com recursos arrecadados pelo Brechó Solidário do Núcleo Feminino Cooperativista. Dessa forma, todas as crianças atendidas têm acesso à correção visual necessária sem custos para suas famílias, garantindo não apenas saúde ocular, mas também inclusão e oportunidade de aprendizado.
A transformação, porém, vai além da visão. Professores destacam que os alunos beneficiados se mostram mais participativos e engajados nas atividades, refletindo também em avanços sociais e de autoestima. “Com os óculos, eles passaram a se concentrar mais, participar das atividades e mostrar interesse em aprender. Foi um ganho cognitivo e também social”, destaca Valéria.
Da dificuldade à descoberta: olhos que se abrem para o aprendizado
Entre os casos mais marcantes está o de Otávio Silva Rodrigues, de 9 anos. Sua mãe, Tatiana, lembra que percebeu os primeiros sinais de dificuldade visual ainda em casa. “Ele chegava tudo muito perto dos olhos, até para brincar ou desenhar. Pedi aos professores para observarem na sala de aula, e elas confirmaram que ele estava forçando a vista e reclamando de dores de cabeça”, conta. Na época, Otávio já havia usado óculos, mas o grau precisava ser atualizado, e o acesso a exames e correções se mostrava complicado devido à distância e à rotina da família.
O projeto ViVer trouxe alívio e facilidades que marcaram Tatiana. “Como moramos no Timbom, é difícil deslocar a criança até a cidade, lidar com transporte e horários. Ter todo o atendimento na escola facilitou muito, e sei que outras mães também ficaram muito agradecidas”, lembra. O cuidado durante a triagem e a consulta deixou a família tranquila: “Ele fez o exame direitinho, foi muito bem tratado, voltou animado para casa e até contou que se divertiu no dia com os coleguinhas. Foi tudo impecável.”
A mudança na vida de Otávio foi perceptível e imediata. Com diagnóstico de miopia e astigmatismo, ele sofria ao forçar a visão, o que provocava dores constantes e atrapalhava o aprendizado. Depois do atendimento, a melhora foi radical: “Ele não teve mais crises de dor de cabeça e passou a conseguir enxergar corretamente sem esforço. Para uma criança, isso faz toda a diferença”, explica Tatiana, emocionada.
Mais do que saúde ocular, o projeto devolveu autoestima e confiança a Otávio. A mãe ressalta o impacto social da iniciativa: “Ver meu filho se adaptando, sem dor, e conseguindo acompanhar os estudos foi emocionante. Além dele, sei que o projeto ajudou muitas outras crianças que, sem essa oportunidade, demorariam anos para ter acesso a óculos ou exames”. Para Tatiana, iniciativas como o ViVer são essenciais, sobretudo para famílias em áreas mais isoladas, garantindo que todas as crianças tenham condições iguais de aprender e se desenvolver.
Ouça o relato emocionado da mãe de Otávio e veja como o projeto transformou sua vida e de muitas outras crianças:
Mulheres que transformam vidas: saúde e educação de mãos dadas

Integrantes do Núcleo Feminino Cooperativista, responsáveis pelo Brechó Solidário que arrecada recursos para a confecção de óculos entregues gratuitamente às crianças atendidas (Foto: Unimed Sul Capixaba).
O Núcleo Feminino Cooperativista, coordenado pela médica Fabíola de Freitas Moraes, mostra como a união e o protagonismo das mulheres podem transformar a vida de crianças e famílias.
“Somos um grupo de voluntárias que acredita na força da união. Ver uma criança descobrir a lua e as estrelas após colocar os óculos pela primeira vez é algo que nos emociona profundamente”.
– Fabíola de Freitas
Para ela, a iniciativa vai além da saúde ocular: integrar cuidados médicos à educação gera resultados concretos no aprendizado e na inclusão social. “Crianças com problemas visuais enfrentam grandes dificuldades para ler e escrever. Ao oferecer acompanhamento e óculos, conseguimos melhorar o desempenho escolar e fortalecer a autoestima”, explica.
A atuação do núcleo também estreita os laços entre escolas e comunidade, permitindo que pais descubram precocemente problemas de visão que poderiam passar despercebidos. “Muitas famílias jamais teriam condições de custear um exame ou óculos. O Projeto ViVer devolve a visão às crianças e traz alívio, esperança e oportunidades para toda a família”, acrescenta Fabíola. Assista ao depoimento da médica e coordenadora do núcleo para entender o impacto desse trabalho na vida das crianças e das famílias.
O efeito multiplicador do cooperativismo
Até agora, o Projeto ViVer já beneficiou 206 estudantes de 12 escolas públicas de Cachoeiro de Itapemirim e do litoral capixaba. Além disso, professores de diferentes regiões foram capacitados, o que multiplica o alcance da iniciativa e garante sua continuidade nos anos seguintes.
Apesar dos desafios para atender a todas as escolas, Fernando Lemgruber acredita no efeito multiplicador. “Cada capacitação é uma semente. Os professores se tornam multiplicadores e, assim, o cuidado se espalha de uma comunidade para outra, criando uma rede permanente de atenção à saúde ocular”, afirma.

Momento de entrega dos óculos para crianças e famílias beneficiadas pelo Projeto ViVer, com a presença de integrantes do Núcleo Feminino Cooperativista e equipe da Unimed Sul Capixaba (Foto: Unimed Sul Capixaba).
A cada edição, o projeto reafirma os princípios do cooperativismo: solidariedade, cuidado com a comunidade e participação coletiva. Médicos voluntários, professores, gestores escolares e famílias se unem para garantir às crianças igualdade de condições para aprender e se desenvolver.
Para 2025, a expectativa é ampliar o alcance, contemplando novas escolas e fortalecendo parcerias. “Nosso sonho é que essa seja uma ação perene, repetida ano após ano, porque o direito de enxergar bem é também o direito de sonhar com um futuro melhor”, conclui Fernando.
No brilho dos olhos de cada criança que recebe seu primeiro par de óculos, está refletida a força da cooperação e o poder de enxergar o futuro.
Assista agora ao vídeo especial e veja como a solidariedade e o cooperativismo se transformam em esperança e novas oportunidades para as crianças capixabas.
O Projeto ViVer e os princípios do cooperativismo

O Projeto ViVer é um exemplo vivo da aplicação dos sete princípios do cooperativismo. Mais do que oferecer consultas oftalmológicas e óculos gratuitos, a iniciativa fortalece valores que são a base desse modelo.
Ela promove o interesse pela comunidade, ao garantir que todas as crianças tenham acesso à saúde ocular e, consequentemente, à educação de qualidade. Estimula a educação e formação, capacitando professores para identificar precocemente dificuldades visuais e atuar como multiplicadores do conhecimento. Incentiva a participação democrática, envolvendo escolas, famílias, profissionais de saúde e voluntários na construção coletiva de soluções.
Além disso, o projeto é uma expressão prática da intercooperação, unindo cooperativa de saúde, núcleo feminino cooperativista, escolas e voluntários em um esforço conjunto para transformar realidades e criar oportunidades de desenvolvimento para toda a comunidade escolar.
Os sete princípios cooperativistas transformam solidariedade em ação e inspiram iniciativas como o Projeto ViVer (Fonte: Sicoob | Imagem: Lízzie Almeida/Sicoob)