Por Izabelle Sampaio
As mudanças climáticas afetam a saúde e a infraestrutura, impactando, assim, o trabalho de cuidado na atualidade.
Embora as mudanças climáticas sejam um fenômeno presente na história do planeta desde os tempos remotos, seus efeitos têm se intensificado nos últimos anos devido à ação humana, ameaçando os sistemas de saúde e a infraestrutura das cidades, e colocando diversas populações em situações de vulnerabilidade. É fundamental, primeiro, compreendermos o que são as mudanças climáticas para, então, entendermos seus impactos na sociedade.
O que são mudanças climáticas?
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a mudança climática refere-se a alterações de longo prazo nas temperaturas e padrões climáticos. Essas mudanças podem ocorrer naturalmente, como variações nos ciclos solares, mas, desde o século XIX, as atividades humanas tornaram-se a principal causa.
O climatologista peruano, José Antonio Marengo,explica que existem tanto causas naturais quanto humanas para a mudança climática. Entre as naturais, incluem-se a distância entre a Terra e o Sol e as erupções vulcânicas, que liberam aerossóis capazes de bloquear a radiação solar. Já entre as causas antropogênicas, destacam-se a queima de combustíveis fósseis, a agricultura, a pecuária e o desmatamento.
A ONU enfatiza que a geração de energia a partir de combustíveis fósseis é um dos principais fatores de preocupação, já que grande parte da eletricidade ainda provém da queima de carvão e gás, que emitem dióxido de carbono e óxido nitroso, gases que intensificam o efeito estufa. Além disso, as emissões industriais, o desmatamento e os meios de transporte, como caminhões, navios e aviões movidos a combustíveis fósseis, também são grandes responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, contribuindo significativamente para as mudanças climáticas.
De que forma as mudanças climáticas afetam a saúde e a infraestrutura?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que as mudanças climáticas representam uma das mais urgentes emergências de saúde da atualidade. De acordo com o Relatório Especial COP26 sobre Mudanças Climáticas e Saúde (2021), eventos extremos como ondas de calor, tempestades e inundações têm causado milhares de mortes e impactado milhões de pessoas. Esses eventos também comprometem sistemas de saúde e a infraestrutura das cidades, colocando populações vulneráveis em risco.
A OMS estima que reduzir a poluição atmosférica poderia diminuir em 80% o número total de mortes globais, a crise climática também ameaça a segurança alimentar e hídrica, com extremos climáticos prejudicando o acesso à água potável e a produção de alimentos, levando milhões à fome e à insegurança hídrica, especialmente em regiões como África, Ásia, América Latina, pequenas ilhas e o Ártico.Outro impacto grave das mudanças climáticas, segundo a OMS, é o aumento de doenças transmitidas por alimentos, água e vetores, como mosquitos. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) destaca que doenças infecciosas, como leishmaniose, malária, dengue e outras arboviroses, estão entre as mais sensíveis a essas mudanças.
Na entrevista concedida ao veículo de informação, Gisele Medice, engenheira civil pela Universidade do Espírito Santo e doutora em Engenharia Ambiental pela UCL, confirmou que as mudanças climáticas podem, de fato, influenciar a saúde. Segundo ela, estamos expostos a eventos extremos, como ondas de calor, baixa umidade, secas, enchentes e queimadas, que resultam em uma série de consequências.Esses fenômenos aumentam a incidência de doenças respiratórias, reduzem o acesso à água potável e favorecem a disseminação de doenças transmitidas por água contaminada. Além disso, dificultam o acesso a recursos naturais e alimentos, aumentam a parcela de serviços públicos de saúde e elevam os níveis de pobreza. Enquanto as populações mais vulneráveis enfrentam sérias dificuldades no curto prazo, no longo prazo, os impactos das mudanças climáticas afetam a todos nós.
No âmbito da infraestrutura,o artigo ‘análise dos impactos das mudanças climáticas na infraestrutura urbana’ expõe que as mudanças climáticas representam uma grande ameaça à sustentabilidade e ao funcionamento das cidades em todo o mundo. Com o aumento da temperatura global e a intensificação de eventos climáticos extremos, a infraestrutura urbana enfrenta desafios cada vez maiores para se adaptar e mitigar os impactos dessas mudanças.A infraestrutura urbana é essencial para a vida nas cidades, pois fornece serviços básicos como transporte, água, energia, saneamento e habitação. No entanto, essa infraestrutura está sob pressão devido a eventos climáticos extremos, como inundações, ondas de calor e secas, que se tornaram mais frequentes e intensos, colocando em risco a funcionalidade e a segurança das cidades.
Um dos principais impactos das mudanças climáticas é o aumento das inundações. A elevação do nível do mar e as chuvas mais intensas causam acúmulo de água que os sistemas de drenagem não conseguem lidar, resultando em inundações em áreas urbanas densamente povoadas. Essas inundações danificam edifícios e infraestruturas essenciais, causando enormes prejuízos econômicos e sociais.Além disso, a crescente demanda por energia e água potável, impulsionada pelo aumento das temperaturas e pela rápida urbanização, apresenta outro desafio significativo. As ondas de calor têm sobrecarregado os sistemas de energia, aumentando o risco de apagões, enquanto a escassez de água se torna uma preocupação em muitas cidades, especialmente aquelas propensas a secas. Isso torna necessário o desenvolvimento de estratégias de gestão sustentável da água.
As mudanças climáticas também acentuam as desigualdades sociais e econômicas nas áreas urbanas. As comunidades mais vulneráveis, muitas vezes formadas por populações desfavorecidas, vivem em áreas de alto risco e têm acesso limitado a serviços básicos e infraestrutura. Essas comunidades estão mais expostas aos riscos climáticos e sofrem com a falta de resiliência.Para enfrentar esses desafios, as cidades precisam adotar medidas de adaptação, como o planejamento do uso do solo para evitar construções em áreas de risco, a implementação de sistemas de drenagem sustentáveis e a construção de infraestrutura mais resistente.A implementação dessas medidas requer compromisso político, financiamento adequado e colaboração entre governos, setor privado, sociedade civil e comunidades locais. Somente assim será possível garantir a resiliência das áreas urbanas diante das mudanças climáticas.
De que forma esses fatores influenciam no trabalho de cuidado?
Quando questionada sobre a faixa etária mais afetada pelos efeitos das mudanças climáticas, a engenheira,Gisele Medice, afirmou que crianças e idosos são os grupos mais vulneráveis. De acordo com a bióloga e pesquisadora de poluição da Universidade de São Paulo, Mariana Veras, isso ocorre porque o sistema de regulação da temperatura das crianças é imaturo, o que faz com que elas demorem mais para se adaptar às mudanças, já os idosos possuem um sistema imunológico mais enfraquecido. Quando essa parcela da população é mais impactada, surgem grandes dificuldades, pois são justamente os que mais dependem de cuidados e suporte.
Infelizmente, muitos idosos não dispõem dos recursos físicos, mentais, sociais e financeiros necessários para enfrentar ou atenuar os efeitos do clima extremo, especialmente nas regiões do sul global. Ondas de calor, por exemplo, podem ser fatais para os idosos, já que sua capacidade de regular a temperatura corporal diminui com a idade. Esse risco é agravado por condições crônicas de saúde, como doenças cardiovasculares, respiratórias, diabetes e maior propensão à desidratação.Profissionais de cuidado, nessas situações, precisam estar mais vigilantes e intensificar seus esforços para garantir a saúde e o bem-estar desses grupos.
Quando falamos sobre as inundações urbanas, é importante destacar o impacto direto nas atividades cotidianas, especialmente para quem depende da mobilidade para trabalhar. As enchentes podem causar bloqueios nas vias, prejudicar o transporte público e impedir que trabalhadores cheguem aos seus empregos,nesse caso o trabalho de cuidado, afetando tanto o rendimento individual quanto o funcionamento de serviços essenciais. Em cidades mal preparadas para lidar com essas ocorrências, o problema se agrava, pois a infraestrutura de drenagem pode ser insuficiente ou mal mantida.
O aumento da intensidade de fenômenos climáticos, como inundações, ondas de calor e tempestades, sobrecarrega e, em muitos casos, compromete a infraestrutura essencial para o transporte, energia e abastecimento de água nas cidades. Isso impacta diretamente a acessibilidade e a mobilidade dos profissionais de cuidado, que muitas vezes precisam se deslocar para atender seus pacientes ou assistidos em residências ou instituições. Quando há interrupções no transporte público ou bloqueios nas estradas por conta de enchentes, esses trabalhadores enfrentam dificuldades para chegar aos seus locais de trabalho, o que pode atrasar ou até impedir o atendimento.
Além disso, falhas na infraestrutura elétrica, comuns durante tempestades severas, podem dificultar o funcionamento de equipamentos médicos em hospitais ou clínicas, prejudicando diretamente o trabalho dos profissionais de saúde e colocando a vida dos pacientes em risco. As falhas no abastecimento de água e saneamento básico, causadas por desastres climáticos, também podem criar condições insalubres, que aumentam a necessidade de cuidados e dificultam o trabalho dos profissionais.
O trabalho de cuidado é essencial para o bem-estar e a qualidade de vida de crianças, idosos, doentes e pessoas com necessidades especiais, garantindo sua saúde, segurança e dignidade. Esses profissionais oferecem suporte emocional, físico e prático, muitas vezes atuando como pilares nas redes familiares e sociais. Além de sua função social, o trabalho de cuidado é vital para o funcionamento das economias, permitindo que outras atividades se desenvolvam. Valorizar e proteger esses trabalhadores é fundamental para uma sociedade mais justa e resiliente.